Se eu pudesse escolher uma
expressão que me definisse, diria que sou matuto, um matuto de nascença e de
morrença. Nasci e vivi os meus primeiros anos de vida literalmente no pé da
serra, todos os dias saía ao raiar do sol pela estrada empoeirada até o curral do seu
Tota, onde enchia a minha vasilha (bem pequenina, proporcional ao meu tamanho)
de leite e levava até os meus irmãos menores.
A minha adolescência passei em
cidade grande, para os nossos padrões matutos, que na verdade era apenas uma
extensão daquela vida da roça. Como cresci nesse mundo, sou um matuto de
nascença, só que hoje, vivo nessa metrópole desejando ardentemente terminar
todas as tarefas a mim propostas e lá voltar.
Quando eu chegar lá, direi que
não me acostumei com os barulhos daqueles carros e motos, com a solidão desses
apartamentos, com esses poucos e raros laços de amizade, com a pressa de um povo
que corre para lugar nenhum, com a violência que corrói a esperança.
Sentarei novamente na calçada até
tarde, rirei das crianças brincando no meio da rua ou correndo da dona Chica que
deseja rasgar a bola daqueles pivetes, falaremos de tudo e também de todos. E
por volta da meia noite recolheremos nossas cadeiras de balanço, faremos nossas
orações, apagaremos as luzes e descansaremos.
Ao amanhecer, não precisarei ter tanta pressa, a qualquer lugar poderei chegar numa caminhada. E assim
concluir os dias de minha vida, sendo também um matuto de morrença.
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