Tenho trabalhado em organizações da sociedade civil por mais de quinze anos, reunindo experiências que vão desde educador social a coordenação de projetos relevantes regionalmente. Durante esses anos, enfrentei diversos desafios que iam dos relacionamentos interpessoais a dificuldades de implementação de iniciativas que, no papel, faziam muito sentido, mas que, na prática, não apresentavam os resultados esperados. Estas organizações, o mundo das organizações sociais não governamentais, podem ser, ao mesmo tempo, prazerosas no sentido da realização pessoal, mas tão desafiante e focadas em metas quanto o segundo setor.
A missão central das organizações
da sociedade civil é a garantia de direitos para populações em situação de
vulnerabilidade e exclusão social. Para cumprir esse propósito, contam com
equipes de alta dedicação, que, no entanto, frequentemente operam em um cenário
de duplo desafio: remuneração aquém do mercado e condições operacionais muitas
vezes precárias. A despeito dessas limitações, o impacto gerado por esses
profissionais na transformação de seus territórios é inquestionável.
Se faz necessário, portanto,
desconstruir a narrativa romantizada do "herói" abnegado, que
supostamente subsiste sem uma remuneração adequada. Esta visão não apenas é
equivocada, como serve como mecanismo de precarização estrutural do trabalho
nestas organizações. Esse paradigma é perpetuado por meio de parcerias
público-privadas e modelos de financiamento que, ao não incluírem rubricas
adequadas para a valorização do capital humano, comprometem a sustentabilidade
e a própria eficácia do setor.
Observa-se a ascensão de novos
regimes trabalhistas que recrutam trabalhadores sociais sob a égide do
"empreendedorismo". Neste modelo, são instados a atuar como prestadores
de serviço autônomos, celebrando contratos pontuais. Contudo, essa suposta
autonomia encobre uma realidade de subordinação e dependência características
do regime CLT, porém desprovida de sua contrapartida fundamental: a proteção
jurídica, os direitos consolidados e as salvaguardas trabalhistas.
É preciso ampliar o marco de
atuação das organizações da sociedade civil, estendendo a garantia de direitos
para além dos beneficiários finais e abarcando, com igual prioridade, os
profissionais que constituem a força motriz dessas organizações. Nossas ações e
modelos de gestão devem refletir o valor inestimável do trabalho de homens e
mulheres que dedicam suas vidas a promover justiça social, combater
desigualdades e enfrentar violações graves de direitos, notadamente aquelas que
afetam a proteção integral de crianças e adolescentes.
Investir de forma estratégica na
operacionalização dos projetos – o que inclui a valorização salarial, o
desenvolvimento profissional e a garantia de condições de trabalho dignas – não
é um custo operacional, mas um investimento direto no capital humano e na
sustentabilidade desse ecossistema. É uma premissa ética e estratégica
incontornável: não podemos ambicionar a erradicação das desigualdades sociais
por meio de estruturas internas que perpetuam a precarização, geram subempregos
e, paradoxalmente, adoecem categorias inteiras de profissionais dedicados a
construir um mundo mais justo.

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